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O orgulho no serviço da casa de Deus



Auto-suficiência

Esta é a mais comum e a mais constante das formas de manifestação do nosso orgulho. A auto-suficiência se reveste de maior gravidade quando permanece naqueles que são investidos de autoridade na igreja. Estamos sempre pensando que podemos fazer as coisas. E o maior dos sintomas deste mal é a escassez de oração. Quando é que mais oramos? Quando as circunstâncias ao nosso redor estão mais críticas e nossa fraqueza aparece, então mergulhamos em constantes momentos de oração. Mas se as coisas estão bem, oramos menos.

Mas Jesus disse: “Sem mim nada podeis fazer”. Ora, deveríamos então orar constantemente e pelas mais simples necessidades. Não foi esta uma das maiores provas do esvaziamento de Jesus? Nada sabia sem o Pai. Nada fazia que não fosse por direção do Pai. E por isso orava tanto. Não apenas porque amava o Pai, mas porque precisava dele. Jesus sentia que sem o Pai ele não era suficiente. E isto é o contrário de nossa orgulhosa auto-suficiência.


Demonstração de eficácia

Por demonstração de eficácia nos referimos àquele esforço para demonstrar resultados e comprovar sucesso diante dos homens. Exibem-se números, construções e realizações de todo o tipo.

Quanto contraste com Jesus! Ele fazia milagres impressionantes, mas solicitava que não o divulgassem. Não se envergonhava de andar com as pessoas humildes e desprezadas. Não se envergonhou de formar sua mais importante equipe ministerial com homens iletrados e desprezados pelas elites. Ele mesmo não fugiu da profissão que lhe dava fama de homem simples – “o carpinteiro”. Sendo o maior de todos os mestres amou a programação que o Pai fez: morrer tendo apenas um povinho como resultado de seu trabalho, deixando o crescimento e o sucesso nas mãos de seus rudes discípulos. Ó quanta glória! Foi por isso que o Pai o amou. Ele era o perfeito anti-Lúcifer. O anti-Adão. O anti-pecado. Creio sinceramente que foi por assemelhar-se a esta atitude que Deus se agradou tanto de Davi ao ponto de dizer que este era segundo o seu coração (At 13.22). Era segundo o coração de Deus porque tinha um coração anti-Lúcifer e semelhante ao do Senhor Jesus neste aspecto. Deveria nos surpreender o fato de que mesmo ele tendo pecado tão gravemente, depois disto, por muito tempo, Deus se referia ao rei Davi com terna recordação (2Rs 14.3; 18.3; 22.2 – quatro séculos depois!). Ocorre que Davi não buscava a glória dos homens. Não buscava glória para si mesmo (Sl 131.1-3), mas desejava ardentemente a glória de Deus em Israel (Sl 132. 1-5). Queria construir o templo não para ser reconhecido, mas para ver a glória de Jeová. Quando Deus o proibiu por ser homem de guerra, ele manteve firme o propósito da construção através de Salomão, seu filho. Doou grandes somas em ouro de seu tesouro real e levantou ofertas entre o povo de modo que Salomão de nada veio a precisar. Davi amava a glória de Jeová, e Jeová muito o amou. Não foi por acaso que Jesus, segundo a carne, veio da descendência de Davi.

Exigência de acato

Lúcifer queria não somente glória, mas também o poder. Nós, os que exercemos autoridade na igreja, também podemos cair facilmente nesta armadilha do pecado. Já não é uma honra estranha que tenhamos recebido tanta autoridade? Tomamos decisões que incidem sobre dezenas, centenas e em alguns casos milhares de pessoas. Definimos rumos para a igreja. Aconselhamos as pessoas em áreas da maior importância em suas vidas. Já não é demais para um pobre mortal? A submissão que tantos amados irmãos nos concedem deveria nos constranger.

Por que buscaríamos ser inquestionáveis em nossas decisões? Por que julgaríamos que nossa sapiência é tão soberana? Que outra coisa se não o veneno de Lúcifer em nossa carne nos faria detestar o ser contrariados?

Mais uma vez Jesus é o nosso modelo. Ele foi o mais sábio de todos os que já andaram pela terra, mas com que paciência suportou a contrariedade dos que por não o compreenderem se escandalizavam nele, tanto seus conterrâneos (Mt 13.57), quanto seus próprios discípulos (Jo 6.60-61).

Mais autoridade que submissão

Para que possa exercer seu ministério com eficácia e conduzir os irmãos pelos caminhos do Senhor, Deus investiu de muita autoridade a liderança da igreja. Estes líderes devem tomar decisões que interferem na vida de todo o povo de Deus. Estabelecem programas de trabalho, estratégias de ação e toda sorte de eventos e atividades. Além daquilo que é organizacional, estes homens exercem ainda a sua influência sobre a própria vida particular dos irmãos. Recebem da parte do Senhor a autoridade para esclarecer a doutrina, instruir os irmãos em todas as áreas de suas vidas, insistir, corrigir, exortar e até mesmo disciplinar.

Devemos reconhecer que esta é uma questão muito delicada, pois todos estamos sujeitos a erros, e quando um líder falha ele pode causar muitos males. Só há uma garantia: que todos na igreja se sujeitem, principalmente os que estão investidos de autoridade. Estes devem ser os primeiros a dar exemplo. Um dos maiores males da igreja são os líderes solitários que não se sujeitam a ninguém.

Somente o orgulho da carne pode sustentar este tipo de atitude. Como explicar que alguém exerça autoridade sobre os demais ao mesmo tempo em que ele mesmo não se sujeita a ninguém? Parece que a autoridade recebida é vista como um atestado de competência e aprovação e que já não é necessário sujeitar-se. Mais um engano que provém do orgulho.

Paulo disse: “sujeitando-vos uns aos outros”. No Novo Testamento vemos como as lideranças praticavam este ensinamento. Não havia líderes independentes. Em todos lugares onde a igreja surgia, pastores e presbíteros se sujeitavam às equipes apostólicas que havia. Seja à de Paulo e seus companheiros no mundo gentio, seja à dos doze de Jerusalém no mundo judeu. E os próprios apóstolos sujeitavam-se uns aos outros nos seus relacionamentos. Paulo repreendeu a Pedro diante de todos e este evidentemente acatou a repreensão (Gl 2.14). O mesmo Paulo dependia tanto de seus companheiros, que quando o próprio Senhor lhe abriu uma porta para a pregação em Trôade, não encontrando a Tito, ficou sem paz para aproveitar a oportunidade (2Co 2.12-13). A sujeição entre eles era tão consistente que quando não foi praticada entre Paulo e Barnabé, isto foi surpreendente para todos e destacado como coisa anormal e indesejável.

Nestes anos de serviço na casa de Deus, tenho observado que aqueles homens que nunca se sujeitam a ninguém são, justamente, os mesmos que usam a sua autoridade com maior intensidade. Reúnem em torno de si, homens e mulheres subservientes. Abusam da fé dos simples e os atemorizam com ameaças de todo tipo. Ai de quem os questionar ou desobedecer! Mas eles mesmos consideram-se inquestionáveis e intocáveis.

Há algo de Lúcifer nesta atitude. É lamentável constatar que haja tantos que se sujeitem a isto. Paulo mencionou esta atitude tolerante na sua segunda carta aos coríntios: “Tolerais quem vos escravize, quem vos devore, quem vos detenha, quem se exalte, quem vos esbofeteie no rosto” (2Co 11.20). Os evangélicos costumam repudiar o Papa, mas que faremos quanto aos nossos “papinhas”? A pompa dos títulos

O que é um título? É um reconhecimento que se recebe, pelo qual a sociedade nos dá o direito de colocá-lo antes de nosso nome. Por exemplo: “doutor”. Por isso, devemos por respeito a este direito adquirido, chamar alguém de “doutor Fulano” ou “professor Beltrano”.

A função ou ofício que alguém exerce na sociedade nunca deve ser usada na frente do nome como um título. Soa estranho. Por exemplo: “dentista Fulano” ou “balconista Beltrano”. Quem não tem nenhum título não deve usar nada. É só fulano ou beltrano.

Jesus nunca nos conferiu um título. Deu-nos funções de serviço. Quando alguém está sendo reconhecido como pastor não está sendo promovido, está sendo rebaixado. Antes era um servo como todos os demais servos do Senhor; agora está sendo rebaixado a servo dos servos. Isto se evidencia na parábola do servo vigilante (Lc 12.42).

Um pastor recebe autoridade sim, para servir na igreja, mas é um engano confundir esta autoridade com um posto de proeminência com direito a título. Paulo disse que os apóstolos tinham autoridade na igreja acima dos pastores e dos profetas (1Co 12.28 – e isto confere com At 2.42), mas qual a proeminência que eles tinham? “Em último lugar... lixo do mundo, escória de todos”. (1Co 4.9-13 – na mesma carta!). Ser apóstolo, então, é mais rebaixamento ainda. Por que então usamos esta função de serviço na frente do nome, como se fosse um título? “Pastor Fulano”! E agora isto já não basta, pois temos “Apóstolo Beltrano” e “Bispo Mengano”. Onde isto vai parar? Onde lemos Paulo ou Pedro fazendo isto? Paulo era Paulo e Pedro era Pedro. O próprio Senhor Jesus ama que seu povo o trate simplesmente pelo nome. Nunca vi ninguém orando – Pastor Jesus. Mas apenas Jesus, ou então amado Jesus. Quantos pastores se escandalizariam se os irmãos simplesmente os chamassem de “querido Fulano”.

Política partidária

No exercício de autoridade podemos ser tentados a tomar decisões que favoreçam o nosso ministério em detrimento de outros. Isto manifesta orgulho e é uma afronta a glória de Deus. É o que chamamos de política partidária. Aproxima-se do comércio que Lúcifer fez por ocasião de sua rebelião: usou dos dons e da sua autoridade para se promover.

Da mesma forma podemos fazer comércio se usarmos desta autoridade para favorecer aqueles que são próximos a nós. Devemos, antes, decidir sempre em função do que é mais justo e melhor para a glória de Deus e a edificação da igreja. O contrário disto demonstrará um coração desejoso de grandeza. A influência dos interesses sobre as deliberações na igreja leva a decisões carnais que desagradam profundamente ao Senhor.


Marcos Moraes - Livro: A si mesmo se esvaziou

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